Muitos dos nossos comentadores, políticos, jornalistas, economistas, especialistas e outras palavras acabadas em istas – alguns socialistas, mas não comunistas... – não se têm cansado de repetir a cassete de que nós não somos iguais à Grécia.
Esquecem-se que, antes desta crise, a Grécia também não era igual à Grécia, se é que se pode dizer isto.
Ou seja, os Gregos também eram um povo pacífico, antes de os grandes da Europa, a mando das agências de rating – por sua vez a mando dos verdadeiros senhores do Mundo, os capitalistas –, os terem começado a tratar como se fossem uma cambada de caloteiros, calaceiros, arruaceiros e outras palavras acabadas em eiros.
Que lá os há, há.
É como cá.
Mas esta estratégia, que vem desde o início da crise – não esqueçamos que os irlandeses, primeiro, e os espanhóis, depois, também o disseram relativamente a nós... –, é completamente errada e estúpida, porque não dizê-lo?, por duas razões:
1. Porque ao querermos distanciar-nos dos Gregos, como se eles tivessem lepra, estamos a legitimar idêntica atitude por parte dos outros em relação a nós.
Ou seja, aceitamos que o que se deve fazer é castigar os países com défice excessivo, em vez de os ajudar.
2. Mas principalmente porque, ao fazermos isto, estamos a esquecer-nos de uma palavra que deveria ser a base de toda a construção europeia: SOLIDARIEDADE!
Nas sociedades modernas – talvez menos do que nas mais "atrasadas"... – esta palavra não pode ser vã, porque é a base da própria civilização, em última análise o que nos distingue dos animais, que deixam sem remorsos morrer os mais fracos.
Querer construir uma União Europeia desta forma, deixando cair – mais, empurrando para o abismo – os pequenos países, com economias mais frágeis, logo na primeira crise a sério, é dizer claramente que tudo isto só foi feito porque os mais fortes queriam um mercado aberto, para poderem escoar os seus produtos.
Nesta "construção europeia" fica então reservado para os mais fracos o papel de "embrulho" de entrar essencialmente por dois motivos: como consumidores e como criados.
Consumidores, porque obviamente compramos os produtos tecnologicamente desenvolvidos dos mais ricos.
Criados, porque estando nós no Sul, onde o sol e as praias – que os nórdicos adoram – abundam, ficamos condenados a trabalhar no turismo, na hotelaria, na restauração, construindo e cuidando de fantásticos campos de golfe – onde a grande maioria de nós nunca jogará e que consomem milhões e milhões de litros de água, que é um bem cada vez mais escasso –, para que os nossos "senhores" do Norte venham quando quiserem gozar umas belas e merecidas férias.
Não temos outros produtos que possam ser competitivos no mercado comum europeu, porque tecnologia é coisa que pouco "nos assiste" e quanto aos nossos produtos tradicionais, baseados nos baixos custos de produção, os chineses encarregaram-se de dar cabo deles sem qualquer dificuldade, com a sua produção de artigos de baixa qualidade, produzidos por uma mão-de-obra quase escrava.
Isto porque os iluminados dos alemães, mas também os franceses, lhes abriram o nosso mercado, para em troca poderem entrar no imenso mercado chinês com os seus automóveis e não só – mas também...
Claro que nós também temos muitas culpas no cartório, principalmente porque não aplicámos correctamente os fundos comunitários.
A corrupção e as grandes obras públicas foram uma constante neste País desde a nossa entrada na CEE.
A poupança rapidamente desapareceu dos nossos hábitos, cedendo o lugar a uma ânsia desenfreada de consumo.
As remessas dos nossos emigrantes caíram drasticamente, reflectindo um novo tipo de perfil de emigrante português, agora já não interessado em amealhar o máximo possível para um dia regressar à pátria, mas sim em ficar junto dos seus nos países de acolhimento.
Só que a hora não é de ajustar contas, mas sim de lutar contra a crise.
Vencida esta, aí sim, será tempo de ajustar contas com o passado.
Não para punir aqueles que consumiram desbragadamente, mas sim para de uma vez por todas eliminar os défices monstruosos criados em anos a fio de ilusão de riqueza, ajustando e equilibrando definitivamente o deve e haver da criação de riqueza.
É que tão culpados foram os que compraram mais do que a sua riqueza lhes permitia, como os que lhes venderam tudo e mais alguma coisa, principalmente porque até lhes emprestaram o dinheiro para isso.
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